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quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Coleção Hitchcock e O Realismo Impossível de Bazin



Inspirações de Hitchcock e considerações de André Bazin
Por César Alves

Os fãs da sétima arte têm dois bons novos motivos para passear pelas livrarias: A Coleção Hitchcock e O Realismo Impossível.
A saborosa Coleção Hitchcock estréia com dois títulos de tirar o fôlego: Vertigo – Um corpo que cai, da parceria de Pierre Boileau e Thomas Narcejac, e A Dama Oculta, escrito por Ethel Lina White e publicado como The Wheel Spins em 1936. Ambos inéditos no Brasil.
Como o próprio nome já diz, trata-se de uma série dedicada a publicar romances que originaram filmes inesquecíveis sob a condução do mestre do suspense. Por outro lado, não só cinéfilos e cultores da obra de Alfred Hitchcock encontram motivos para celebrar os lançamentos que também devem levar ao deleite os admiradores da ficção noir e literatura de mistério e assassinato. A coleção surge com o objetivo de trazer ao Brasil obras de autores europeus – nomes que são referência na literatura policial de qualidade mundial –, dedicados aos gêneros Thriller, Scandi crime e suspenses históricos.
O Realismo Impossível reúne textos de André Bazin até agora inéditos no Brasil. Os textos aqui reunidos foram compilados por seu discípulo e amigo pessoal, François Truffaut. A primeira parte traz artigos retirados de seu livro Jean Renoir, considerado por Truffaut “o melhor livro de cinema, escrito pelo melhor crítico sobre o melhor diretor”. Já a segunda parte compila textos retirados da coletânea Le Cinéma de l´occupation ET de La résistance, onde o crítico explora o realismo no cinema possível e impossível.

Fundador da revista Cahiers Du Cinéma e colaborador do Le Parisién Liberé, France Observateur, L´Écran Français, Esprit e Les Temps Modernes, entre outros, a visão revolucionária de André Bazin sobre a sétima arte como “arte do encontro do real” representa uma das mais importantes colaborações ao pensamento cinematográfico e a forma de ver, compreender e escrever sobre filmes.

Serviço:
Coleção Hitchcock:
Vertigo – Um Corpo que cai
Autores: Pierre Bouileau e Thomas Narcejac
Tradução: Fernando Scheibe
192 páginas

A Dama Oculta
Autor: Ethel Lina White
Tradução: Rogério Bettoni
272 páginas
Editora: Vestígio

O Realismo Impossível
Autor: André Bazin
Organização e Tradução: Mário Alves Coutinho
224 páginas

Editora: Autêntica

terça-feira, 11 de outubro de 2016

Um Breve Perfil de Angela Davis



Um Breve Perfil de Angela Davis

Com um atraso de mais de trinta anos, a Boitempo Editorial lança no Brasil Mulheres, Raça e Classe da ativista norte-americana.
Por César Alves

Ativista e professora de filosofia na universidade de Santa Cruz, na Califórnia, Angela Davis nasceu no Alabama. Péssimo lugar para ser negro e mulher, na América segregacionista dos anos quarenta – terra da Ku Klux Klan, dos linchamentos quase rituais e das execuções por enforcamento, que lembravam strange fruits brotando nas árvores, como diz a canção.
Não é de se estranhar que, em meio a tal ambiente, a menina crescesse sob o signo da indignação e da revolta.
Já aos 12 anos participa do boicote a uma linha de ônibus que praticava segregação entre seus passageiros. Considerada brilhante por professores, dois anos depois, Davis ganha uma bolsa para estudar no liceu Little Red School House e muda-se para Nova York.
Conciliando seu ativismo político com a dedicação aos estudos, é aceita na Universidade de San Diego, na Califórnia, onde é presa pela primeira vez num protesto contra a guerra do Vietnã. Radicaliza-se e, ainda que discordante de algumas das posições de seus companheiros, Angela adere ao Black Panther Party de Bobby Sela e Huey P. Newton.
Suas ações junto à organização logo a colocaram no alvo do FBI de J. Edgar Hoover, empurrando-a para a clandestinidade. Durante meses saltou de esconderijo a esconderijo, até sua prisão no início da década de 1970, que deu origem a uma série de protestos e ao movimento, de repercussão mundial, Free Angela Davis, que pedia sua liberdade. Ganhou versos em sua homenagem do poeta Jacques Prevért, canções da dupla Jagger e Richards, Yoko Ono e outros artistas.
Fora da prisão, Angela Davis abandonou as armas, mas jamais a luta. Ainda hoje, aos 72 anos, Davis é sempre combativa, seja em nome dos direitos das mulheres, contra a intolerância e a crueldade para com os animais.

Inspiração para o documentário Free Angela and all polital prisioners (2012), Angela Davis escreveu diversos livros. Entre eles, Mulheres, raça e classe, que a Boitempo Editorial acaba de lançar por aqui.
Publicado em 1981, os 35 anos que separam a edição original em inglês da tradução, agora disponível para os leitores brasileiros, em nada afetam a contemporaneidade e a relevância da obra. O que pode ser um dado triste, significando que, no que toca à condição da mulher numa sociedade fálica, da negritude numa cultura segregacionista e da pobreza em meio ao capital selvagem e a ditadura do consumo, muito pouco ou praticamente nada evoluímos.
O lançamento vem na cola de Reivindicação dos Direitos da Mulher, da mãe de Mary Shelley e feminista avant la léttre Mary Wollstonecraft (mais: http://orebitedoverbo.blogspot.com.br/2014/07/familia-sagrada-william-goldwin-mary.html), que a mesma editora publicou por aqui recentemente.

Serviço:

Livros:
Mulheres, raça e classe
Autor: Angela Davis

Reivindicação dos Direitos da Mulher
Autor: Mary Wolstonecraft

Editora: Boitempo Editorial


quarta-feira, 5 de agosto de 2015

A Barbárie dos Homens e a Paixão do Menino, Segundo Dostoiévski




A Barbárie dos Homens e a Paixão do Menino, Segundo Dostoiévski

Distintas na forma e conteúdo, Recordações da Casa dos Mortos e O Pequeno Herói estão diretamente ligadas à jornada do autor russo aos Infernos do Cárcere.
Por César Alves

1849 foi um ano ruim para Fiodór Dostoiévski.
Encarcerado, sob a acusação de conspirar contra o czar Nicolau I, e a espera de um julgamento, cujo veredicto, conforme o autor talvez já esperasse, seria culpado. O que pode ter causado surpresa foi a sentença e condenação, pena de morte, já que, na época, Dostoiévski gozava de certa notoriedade, como um dos mais promissores jovens talentos da literatura de seu país, graças a boa recepção de Gente Pobre (Editora 34), seu livro de estréia, publicado três anos antes.
Acompanhado de seus supostos cúmplices de conspiração, Dostoiévski chegou a ficar de frente com o pelotão de fuzilamento e vislumbrar o olhar frio e sentir o odor de necrose e o bafo da Morte em seu cangote. No último instante, no entanto, quando os atiradores já estavam a postos e prestes a efetuar os disparos, um emissário do governo aparece com um documento que substituía a pena máxima por quatro anos de trabalhos forçados na Sibéria, seguida de mais cinco anos servindo como soldado voluntário do exército russo. Mais para encenação cruel e sádica, com o intento de quebrar de vez o espíritos dos inimigos do Estado, do que demonstração de benevolência política, certo é que o episódio seria o primeiro dos muitos, durante o martírio penal, que marcaria de forma indelével sua obra e biografia.
O drama prisional do mestre russo está diretamente ligado a dois excelentes títulos recém chegados às livrarias brasileiras, Recordações da Casa dos Mortos (Nova Alexandria) e O Pequeno Herói (Editora 34).
O primeiro, também conhecido por Notas da Casa dos Mortos, é uma edição revista, de capa dura, da tradução de Nicolau Peticov, que andava sumida das prateleiras. Inspirado em suas anotações clandestinas – o autor foi proibido de escrever, durante o cumprimento de sua pena –, sobre sua experiência nos campos de trabalhos siberianos e suas conversas com outros condenados, realizadas entre 1850 e 1854.
Originalmente, a obra foi publicada em capítulos, de 1860 à 1862, no periódico Mundo Russo. Escrito como romance, Recordações da Casa dos Mortos conta história de Aleiksandr Pietrovitch, assassino confesso de sua esposa seus dias de tormento como condenado a trabalhar na franquia siberiana do Inferno, pelas quais também passou seu criador. E é justamente esse tempero autobiográfico que faz do livro mais do que um romance.
Embora construída como ficção, a obra é dotada de inegável conteúdo documental. Trata-se de um rico, minucioso e brilhante estudo sobre a miséria humana, análise social e psicológica e depoimento quase pessoal sobre o cotidiano brutal de condenados e carcereiros, oprimidos e opressores; o inconsciente conflituoso entre sentimentos de fúria, resignação, apatia e revolta, num caldeirão de violência e miséria.

O Menino e o Sexo
Talvez por ser parte da produção de seus dias de cárcere – escrito na prisão, entre julho e dezembro de 1849 –, O Pequeno Herói pode surpreender alguns leitores de Fiodor Dostoiévski, por parecer tão distante do contexto sombrio em que o autor se encontrava ao concebê-lo e que se fez presente em grande parte de sua obra.
Uma leitura das cartas que o autor escreveu para seu irmão do cativeiro, no entanto, pode apontar a narrativa como fruto direto do impacto sobre o autor da percepção do verdadeiro valor do convívio social e grandeza encontrada num raio de sol sobre seu rosto. Algo que, não só os dotados da sensibilidade artística, mas todo o gênero humano só venha a se dar conta quando uma vez tendo sido privado.
Análises pretensiosas à parte, aqui, o ambiente descrito é composto de belas paisagens, passeios e manhãs ensolaradas de dias de verão, clima pouco explorado por Dostoiévski na maioria de suas criações. Assim como pode parecer também a trama, que gira em torno da descoberta do amor por um garoto de dez anos de idade.
Narrado em primeira pessoa por um menino, o texto nos é apresentado como relatos de suas memórias em relação a acontecimentos que marcaram o fim de sua primeira infância. Em seu relato ele descreve os dias daquele verão em que se apaixonou pela primeira vez. Amor impossível, como é sempre nessa fase, por uma mulher mais velha e casada.
Dotado de uma poesia singela, O Pequeno Herói explora o começo do fim das inocências infantis, o despertar do amadurecimento – há uma bela simbologia na passagem em que o protagonista decide montar um cavalo selvagem e quase morre, na tentativa de impressionar sua musa – de forma quase inocente. E, quando digo quase inocente, é porque Dostoiévski nunca é inocente.
Uma leitura mais atenta deixa claro, logo nas primeiras páginas, que mais que o despertar do amor, o autor também fala sobre a descoberta dos desejos sensuais na infância, bem antes daquele famoso médico de Viena.
Nosso herói, a principio, também volta sua atenção à uma moça mais jovem, a mais bela e jovem, por quem o menino se sente atraído, mas de uma forma diferente da atração que sente por sua musa. O que o atrai aqui, está mais ligado às suas belas formas. Percebendo isso, a garota acaba se aproveitando disso para atraí-lo e pregar-lhe peças, como, por exemplo, quando ela pede a ele para se sentar em seu colo e, entre um cafuné e outro, desfere-lhe pequenas torturas com beliscões dolorosos. Com sua primeira Famme Fatale, acaba descobrindo que a beleza do objeto de desejo, quase sempre, vem acompanhada de uma crueldade que beira o sadismo.
A tradução é de Fatima Biancchi e ilustrada com gravuras de Marcelo Grassman

Serviço:
Título: Recordações da Casa dos Mortos
Autor: Fiodór Dostoiévski
Editora: Nova Alexandria

Título: O Pequeno Herói
Autor: Fiodór Dostoiévski
Editora: 34




terça-feira, 2 de junho de 2015

Linhas de baixo, riffs de palavras e livros de musica - Livros


Linhas de baixo, riffs de palavras e livros de musica

Das memórias de Peter Hook sobre os dias do Joy Division, passando pelo The Cure, ao nascimento da New Wave brasileira, na biografia de um de seus artífices, Kid Vinil, as historias do pós-punk invadem nossas livrarias com o lançamento de ótimos títulos.
Por César Alves

Desde criança, sempre gostei de musica e sempre gostei de histórias, ficcionais ou não e independente da forma como eram contadas. Sendo assim, logo que comecei a ter algum dinheiro, através de bicos e, principalmente, quando passei a ter um salário – miserável, diga-se de passagem –, como Office-boy, por volta dos 14 anos, não é de se estranhar que boa parte de meus gastos pessoais tenham sido na aquisição de discos e livros.
A conversa fiada autobiográfica não é de toda sem sentido. Serve para ilustrar o motivo da empolgação do amigo que vos escreve em relação ao verdadeiro tema deste texto: os mais do que bem vindos livros Unknown Plesures – Joy Division, de Peter Hook, Nunca é o Bastante – A História do The Cure, de Jeff Apter, e Kid Vinil – Um Herói do Brasil, de Ricardo Gozzi e Duca Belintani, das editoras Seoman e Edições Ideal – a segunda, responsável pela biografia de Ian Curtis, também citada aqui.

Sobre jovens e o peso em seus ombros

Poucas bandas na história do rock podem ser comparadas ao Velvet Underground no que diz respeito ao culto e o impacto de sua influência sobre as gerações que as seguiram. Dentre elas se inscreve o Joy Division.
Formado em Manchester por quatro garotos da classe operária sob o nome Warsaw – referência a canção Warszawa, faixa do cultuado álbum Low, da não menos cultuada trilogia de Berlim de David Bowie e Brian Eno –, o Joy Division possui tudo o que é preciso para justificar o culto em torno de sua historia: uma produção tão curta quanto impactante, formada por dois álbuns que se tornaram clássicos, Unknown Plesures (1979) e Closer (1980); originalidade musical e lírica marcantes, atitude e, principalmente, uma biografia marcada pela tragédia.
Eram os dias caóticos e sombrios da segunda metade da década de 70 e, influenciados pela fúria sonora verborrágica do punk rock, os amigos de escola Bernard Summer e Peter Hook, respectivamente guitarra e baixo, se uniram ao baterista Stephen Morris e ao cantor e letrista Ian Curtis para dar início à sua própria banda. É justamente na figura de Curtis que se apóia o dado trágico citado no parágrafo anterior.
Suas letras intensas e carregadas de poética e urgência niilista, associadas à sonoridade sombria e clima tenso, marcado, principalmente, pela produção e Martin Hannett, foram essenciais para criar a aura glacial comumente associada à banda. Seu suicídio, pouco antes de sua banda embarcar para uma turnê pelos Estados Unidos, o que poderia dar início a uma promissora carreira internacional, foi mais do que suficiente para completar o mito – não totalmente desprovido de verdade – do gênio atormentado e deprimido que antecipa o outono de sua existência no auge de sua primavera criativa e torná-lo, junto com sua banda, alvo de inúmeros livros e reportagens – algumas boas, outras nem tanto –, explorando tal imagem.
É justamente por confirmar e, ao mesmo tempo, desmitificar tais características – que vieram se tornar verdadeiros clichês, quando se fala de Ian Curtis e do Joy Division –, mas, principalmente, por lançar novos pontos de vista sobre sua trajetória que as duas obras disponíveis agora nas livrarias brasileiras são especiais.
Lançado recentemente pela editora Seoman, o primeiro, Unknown Pleasures – Joy Division, escrito pelo baixista da banda e, mais tarde, junto com os outros sobreviventes, fundador do New Order, Peter Hook, o livro oferece uma visão interna sobre a história, do ponto de vista de quem participou dela desde o início.
Na condução das quatro cordas de seu contrabaixo, passando por palcos de inferninhos, estúdios de gravação e bastidores de shows, Hook protagonizou e ajudou a construir a historia que narra, de forma honesta e leitura agradável, de seu ponto de vista privilegiado. Embora, humildemente, o baixista não se considere o dono da verdade, como diz em vários momentos, sua versão dos fatos é um relato detalhado e apaixonado daqueles dias de quem esteve e consegue colocar o leitor no olho do furacão que foi a trajetória de sua banda. É como um garoto em uma banda que Hook conta sua história sobre quatro amigos conquistando seu espaço no explosivo nos subterrâneos do rock europeu, com descrições detalhadas de cada uma das apresentações, momentos engraçados e até escatológicos, uso abusivo de álcool e drogas, mas principalmente amizade.
Tocando à Distância, de Deborah Curtis, apresenta uma visão mais íntima e pessoal, focada na persona de Ian Curtis, com quem a autora foi casada e teve uma filha. Publicado no Brasil ano passado, o livro é considerado item essencial para compreender seu biografado na intimidade. Narrativa intensa e comovente, contém imagens da vida familiar de Ian Curtis, além de lançar luz sobre os motivos que o levaram a cometer o ato final que marca sua trajetória – um coração dividido entre as glórias e os excessos de um rock star e o pai de família, entre o amor pela esposa e a amante e, para piorar, a saúde comprometida pela epilepsia. O livro foi a base para a cinebiografia, Control, de Anton Corbjin,e traz prefácios de Jon Savage e Kid Vinil. A publicação é da Edições Ideal.

Jumping Someone Else´s Train

Pela mesma editora, acaba de sair também Nunca é o Bastante – A História do The Cure.
A historia do Cure é como a de diversas bandas ao redor do mundo. Começa com garotos inventando formas para vencer o tédio na cidade de Crawley, Sussex, Inglaterra, até alcançar o estrelato como uma das principais bandas do pop britânico da década de 80.
Falar sobre o The Cure é falar sobre Robert Smith, líder e único integrante permanente em todas as diversas formações que a banda teve até os dias de hoje. Apaixonado por rock desde que, ainda na infância, teve contato com os discos dos Beatles e viu uma apresentação de Jimi Hendrix pela tevê, foi através de David Bowie que Smith aprendeu a importância da imagem para a construção estética de um artista. Lição que seguiria à risca desde o início da banda que formaria com os amigos, sob a inspiração do Punk e do pós-punk em meados dos anos 70.
Também autor de uma biografia sobre os Red Hot Chilli Peppers, o australiano Jeff Apter fez uma série de entrevistas com os integrantes do Cure e seu líder para construir um relato detalhado de sua história em suas diversas fases, disco a disco, turnê a turnê, incluindo suas passagens pelo Brasil, resultando numa obra, no mínimo, indispensável, para fãs ou não.

Adicionar legenda
O Herói do Brasil

“Na hora do almoço a minha fome é de leão. Abro a marmita e o que vejo, feijão. Chega o fim do mês, com toda aquele euforia. Todos ganham bem e eu aquela micharia”. Nos anos de minha primeira infância, assim como todos os garotos da época, sabia cantar de cor a letra desse sucesso das rádios e programas de auditório, mas só alguns anos depois, quando comecei a trabalhar – e aqui está o link com o parágrafo que abre este texto, é que fui entender de verdade do que falava a musica interpretada por Kid Vinil, à frente de seu Magazine.
Não só como cantor do Magazine, mas também como líder dos Heróis do Brasil, Antonio Carlos Senefonte, o Kid Vinil, fez sucesso da década de oitenta com outros sucessos, como Tic, Tic, Nervoso, mas seu papel na construção do rock brasileiro de sua geração e para as gerações vindouras vai muito além disso, como o leitor pode conferir na biografia autorizada Kid Vinil, O Herói do Brasil, de Ricardo Gozzi e Duca Belintani.
De auxiliar de Departamento Pessoal a executivo da gravadora Continental, passando pelo início do punk brasileiro, como vocalista do Verminose, os sucessos nacionais citados acima e o processo hercúleo para trazer aos ouvintes e fãs de musica o que se passava no universo da musica pop internacional, tanto como radialista como apresentador de tevê, a vida de Kid Vinil, que se confunde com a do próprio pop brasileiro, é aqui narrada de forma leve e divertida, contando com depoimento do próprio biografado, familiares, parceiros e gente como Fabio Massari, Fernando Naporano e outros dos que o ajudaram a construir essa historia.

Serviço:

Livros:
Título: Unknown Pleasures – Joy Division
Autor: Peter Hook
Editora: Seoman
392 páginas

Título: Tocando a Distância
Autor: Deborah Curtis
Editora: Edições Ideal
328 páginas

Título: Nunca é o Bastante – A História do The Cure
Autor: Jeff Apter
Editora: Edições Ideal
336 páginas

Título: Kid Vinil – O Herói do Brasil
Autor: Ricardo Gozzi e Duca Belintani
Editora Edições Ideal

160 páginas

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Contra vampiros emos e lobisomens vegans, Lovecraft é a cura - Artigo


Contra vampiros emos e lobisomens vegans, Lovecraft é a cura

Vida e obra de um dos mais criativos e brilhantes autores fantásticos da era moderna ganham as livrarias brasileiras, em plena era do Terror Ritalina.
Por César Alves

A galeria de monstros assustadores que povoam o imaginário humano desde tempos imemoriais, como vampiros, zumbis, gárgulas, lobisomens e demais criaturas mitológicas e folclóricas, quase que em sua totalidade, vem passando por um processo de transformação e modernização, desde o advento da indústria do entretenimento – nem sempre bem vindo, tendo em vista os vampiros emos e licantropos vegetarianos dos livros e filmes blockbusters recentes, que fazem a cabeça da garotada. A mesma indústria que ajudou a tornar ainda mais populares e não menos assustadores – nas interpretações de Boris Karloff, Lon Chaney, Max Schreck, Bella Lugosi e Christopher Lee – parece hoje decidida a destruir a reputação dos personagens de terror clássicos.

Um aficionado por teorias conspiratórias poderia nos chamar a atenção para o detalhe de que ela também é responsável por alguns dos protagonistas dos terrores noturnos contemporâneos, como Freddy Krueger, Jason de Sexta-feira 13, Alien e o Predador, entre muitos outros.
Não acho que seja o caso e estou quase certo de que a coisa tem mais a ver com a percepção, por parte dos produtores e empresários culturais, de que adolescentes, com déficit de atenção, hiperatividade e muito dinheiro dos pais pra gastar, ofereciam um nicho inexplorado para autores e diretores com dislexia. Inventaram o Terror Ritalina ou Ficção Fantástico-Anencefálica (rótulos meus – prometo, que serão os primeiros e últimos).
Achei que não tinha mais volta, estávamos pegos e até passei a amaldiçoar Anne Rice e a culpar seus vampiros metrossexuais – apesar de não listá-la entre os autores e roteiristas a quem me refiro, afinal, possui seus méritos – como precursora disso tudo. Isso até que um de meus sobrinhos, depois de ler O Iluminado e outros de Stephen King, me perguntar por H. P. Lovecraft e me pedir emprestado alguns de seus livros. Levou três deles e, pouco mais de uma semana depois, voltou em busca de outros.
Ta bom, pode ser fato isolado, mas, pouco depois, na livraria de um amigo, chegam algumas garotas saudáveis, bem alimentadas, recém saídas da adolescência, prováveis leitoras da série Crepúsculo, procurando por Lovecraft, citando de memória os títulos que queriam.
Percebendo minha surpresa com a cena, depois de as moças saírem, comenta o amigo livreiro:
“O Lovecraft anda bem popular, entre a garotada. Todo dia, vem alguém aqui procurando. Sempre uma molecada nova, meio moderninha. Sempre foi Cult. Mas ta ficando pop entre os adolescentes.”
Ele disse num tom jocoso, mas, se fosse verdade, achei ótimo, perceber que, ao menos uma parte dos garotos e garotas de hoje estivessem abandonando o Harry Potter, principalmente, sabendo o que a leitura de O Alquimista fez no processo de estupidificação de boa parte dos garotos e garotas da minha época.

Se Lovecraft virou pop, não tenho ainda certeza, mas ver o Cthulhu – entidade cósmica, criada e citada pelo autor em diversas de suas histórias – aparecer em um episódio recente da escatológica animação de Matt Stone e Trey Parker, South Park, pode ser um sinal.
Considerado um dos maiores mestres da arte literária em explorar o fantástico e o medo, Howard Phillips Lovecraft vai muito além. Nascido em 1890, admirador incondicional de Edgar Allan Poe, sua colaboração para com o gênero extrapola concepções, estéticas e convencionais. Criador de toda uma mitologia própria de seres fantásticos e criaturas tão inacreditáveis, quanto assustadoras, Lovecraft praticamente reinventou a literatura de terror, ao misturar com desenvoltura e muita criatividade, o sobrenatural, o científico e o filosófico.
Dono de um intelecto único e pesquisador dedicado do oculto e ciências gerais, em sua obra, o impossível e o fantástico não eram gratuitos. Embora concebido como ficção e sem a pretensão do realismo, em sua grande maioria, para serem publicados em revistas baratas e escapistas – pulp fictions –, suas tramas e situações, seu universo e os personagens que nele vivem, são criados dentro dos limites do possível e, como toda grande obra do gênero, é da ocorrência fantástica, dentro dos limites do real, que provoca medo. Carregadas de seres criptozoológicos, descobertas criptocientíficas e conceitos criptofilosóficos, narrativa alucinante, fruto de uma mente brilhante – insana, para muitos –, suas histórias lhe renderam uma série de rótulos para descrevê-la como única e original, como Weird Fiction, para ficarmos apenas na minha preferida.
Fruto ou não de uma suposta redescoberta do autor por novos leitores, a ótima notícia é que a obra de Lovecraft vem recebendo de editoras como a Iluminuras e Hedra o respeito merecido e, como exemplo e indicação, tanto para novos, quanto para admiradores antigos, segue abaixo alguns dos títulos imperdíveis, disponibilizados nas livrarias brasileiras recentemente.
Pela Iluminuras, que já publicou outros títulos como A Cor que Caiu do Céu, Nas Montanhas da Loucura e O Horror Sobrenatural em Literatura (obra de não ficção, onde o mestre desenvolve um estudo profundo sobre o gênero que adotou e revolucionou), acaba de lançar também O Horror em Red Hook, A Maldição de Sarnath e A Procura de Kardath.
Já a editora Hedra, que há pouco tempo publicou Os Melhores Contos de H.P. Lovecraft, lança A Vida de H.P. Lovecraft, estudo biográfico e artístico, escrito por J.T. Joshi, respeitado mundialmente como um dos maiores especialistas sobre o autor.
Nada mais a dizer, aos amigos e amigas leitores, deleitem-se:

Serviço:

Título: À Procura de Kadath
Título: A Maldição de Sarnath
Título: O Horror de Red Hook
Autor: H.P. Lovecraft
Editora Iluminuras

Título: Os Melhores Contos de H.P. Lovecraft
Autor: H.P. Lovecraft
Título: A Vida de H.P. Lovecraft
Autor: S.T. Joshi
Editora: Hedra




segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

O Evangelho, Segundo o Estranho Misterioso Mark Twain



O Evangelho, segundo o Estranho Misterioso Mark Twain
Por César Alves

Era com admiração e entusiasmo que Samuel Langhorn Clemens assistia o surgimento das maravilhas científicas e tecnológicas que, em meados do século dezenove, imprimiam às previsões sobre o futuro da humanidade a marca da grandeza. Signatário do manifesto contra as atrocidades praticadas pelo soberano da Áustria, Leopoldo, e o domínio de seu país no território do Congo, durante o neocolonialismo europeu no continente africano, Clemens não se dobrava diante das injustiças praticadas pela mesma espécie, quando se mostrava indigna do destino grandioso que tais invenções pareciam descortinar.
Amigo pessoal de Nikola Tesla, Clemens sonhava com o potencial para o bem da humanidade que os experimentos com a eletricidade realizados pelo colega e testemunhados por ele, mas não deixava de ver com desconfiança o verdadeiro uso que seria feito das novas tecnologia, diante da ganância humana, nas mãos erradas.

Era um humanista, mas um humanista descrente da vocação do homem para a prática do humanismo e do bem comum. Autor de clássicos incontestáveis da literatura universal como As Aventuras de Tom Sawyer e Hunckleberry Finn, Clemens ficou famoso como Mark Twain, mas é em seus escritos menos conhecidos – a maioria, datada de seus últimos anos de vida e publicados de forma póstuma – que tal característica é mais evidente.
Exemplo e também o predileto deste que vos escreve é O Estranho Misterioso. Foi o livro que despertou meu interesse pelo autor, quando costumava desprezar autores indicados por pessoas mais velhas e desconfiar de livros que meus professores gostavam, por volta dos dezessete anos, li pela primeira vez.
Aqui você não encontrará o satirista notório e as tramas juvenis que fizeram a fama do autor. Ambientado em uma pacata aldeia da Idade Média, a trama gira em torno de um garoto e uma estranha criança que aparece de forma misteriosa e muda completamente a vida dos habitantes do lugar. Capaz de prever o futuro e operar milagres, como é do feitio dos anjos, seu nome é Satã e é em suas falas que se encontram alguns dos melhores momentos da narrativa, como por exemplo: “(...) Deus não existe, nenhum universo, nenhuma raça humana, não há vida terrena, nem céu, nem inferno. É tudo um sonho, um sonho grotesco e tolo Nada existe, a não ser você . E você é mais um pensamento, um pensamento vadio, um pensamento inútil, um pensamento andarilho, vagando abandonado entre as eternidades vazias!”

Trata-se uma das histórias mais densas e filosóficas de Twain e revela muito sobre o estado psicológico e emocional do autor em seus últimos anos. Fora de catálogo, ainda deve ser possível encontrar exemplares da tradução brasileira que conheço, da editora Axis Mundi, em alguns sebos e livrarias de usados.
Como testemunha ocular e protagonista da história do Gênese, o Anjo Caído também aparece, como orientador dos ingênuos Adão e Eva, em alguns dos melhores momentos dos textos que compõem este recente lançamento da editora Hedra, Diários de Adão e Eva.
Carregado de humor e menos denso do que o primeiro título, Diários de Adão e Eva é apresentado como relatos íntimos e pessoais do Primeiro Casal Bíblico, da expulsão do Éden aos problemas com os filhos, Caím e Abel.
Apesar da carga polêmica que os personagens que protagonizam a narrativa possuem, é preciso ler o livro como uma análise do comportamento humano, principalmente o relacionamento amoroso e conjugal, e não como uma obra religiosa.
Ambas as obras ainda muito atuais, oferecem-nos uma faceta menos conhecida de Mark Twain.

Serviço:
Autor: Mark Twain
Título: Diários de Adão e Eva
Editora: Hedra
140 páginas

Título: O Estranho Misterioso
Editora: Axis Mundi
214 páginas



quarta-feira, 17 de setembro de 2014

A Lenda do Santo Beberrão - Joseph Roth



A Redenção da Boemia

Um dos melhores escritores europeus do período entre guerras, Joseph Roth, volta à nossas livrarias com as traduções de A Lenda do Santo Beberrão e Hotel Savoy.
Por César Alves

Você está numa biblioteca ou livraria e, como que por mágica, um estranho aparece e se identifica como sendo a Morte, avisando-lhe de que seu tempo está prestes a chegar ao fim. Mas, como é do comportamento do Ceifador – a Morte odeia se atrasar e por conta disso, sai cedo de casa para cumprir com seus afazeres –, ele se adiantou demais e informa que você ainda tem entre vinte minutos e meia hora de vantagem, antes de seguirem viagem. Sabendo que é muito pouco tempo para qualquer outra coisa, ele sugere que escolha um livro e faça sua última leitura, já que gosta de ler.
A pegadinha é: Que obra você escolheria?
A brincadeira era feita entre amigos que gostavam de literatura, normalmente ao redor de uma mesa de bar e com muita cerveja. Depois de ouvir da maioria que escolheriam seus poemas prediletos de As Flores do Mal de Baudelaire, Uma Temporada no Inferno de Rimbaud, algo do Bandeira ou um conto de Tolstói e etc, eu dizia que convidaria a Indesejada para ir comigo até um bar para tomarmos a saideira definitiva e, dando uma de Compadre da Morte, como no mito folclórico, tentaria ludibriá-la, embriagando-a e convencendo a danada a cair na farra em direção ao Baixo Augusta. Não funcionando, escolheria como livro derradeiro o belo A Lenda do Santo Beberrão de Joseph Roth.
A protocrônica cotidiana acima é só para falar do grato lançamento – não tão recente, aliás – da Editora Estação Liberdade. Há alguns meses, a editora lançou por aqui traduções de dois títulos de Joseph Roth; A Lenda do Santo Beberrão – principal tema de nosso papo aqui – e Hotel Savoy.
 Considerada “Obra-testamento”, A Lenda do Santo Beberrão foi o último livro escrito por Joseph Roth, também autor de A Teia da Aranha (1923) e A Marcha de Radetzky (1932) e um dos grandes autores universais pouco lidos no Brasil.
A escolha da pedida literária para meus últimos vinte minutos sobre a terra não é apenas por ser uma das minhas preferidas, é que também é possível ler o livro, do início ao fim e sem pressa, em pouco mais de um terço de hora. Trata-se de uma belíssima e curta novela de 22 páginas, capaz de tocar até mesmo aqueles que trazem um bloco de mármore ao invés de um coração batendo no peito.
Escrita como um misto de fábula e parábola cristã – mas nada carola é bom frisar –, A Lenda do Santo Beberrão começa como uma crônica cotidiana ambientada na Paris das primeiras décadas do século vinte, quando toda a Europa vivia envolta em névoas de incerteza, entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial.
Seu protagonista é um mendigo e alcoólatra que vaga pelas ruas e cantos menos iluminados da Cidade Luz, como os muitos que assim o faziam na época. Certa noite, quando se abrigava sob uma ponte do Rio Sena, aproxima-se um senhor muito bem vestido que puxa assunto e lhe oferece uma grande soma em dinheiro (200 Francos). Segundo o estranho benfeitor, o sem teto teria sido posto em seu caminho por designação divina, tendo em vista que ele, sendo um homem de fé, estava a cata de uma ação benevolente a um desconhecido como que para pagar uma promessa em agradecimento à bondade de Deus que nunca lhe faltara.

Apesar de suas condições, o miserável recusa a oferta, não por orgulho, mas por nutrir um profundo senso de retidão e idoneidade. Jamais aceitaria uma soma monetária por caridade, a ser que pudesse compensá-la com seu trabalho ou ter como devolvê-la, como um empréstimo, assim que se encontrasse em melhor situação.
Sendo ambos devotos de Santa Terezinha de Lisieux, o impasse é resolvido com o mendigo se comprometendo a devolver o valor que lhe é entregue à caixa de donativos da igreja da santa, no prazo de uma semana.
Com mais dinheiro do que jamais possuíra, o pobre coitado aproveita para alugar um quarto num albergue, tomar um banho e dormir numa cama, como não fazia há anos. Boêmio e incapaz de resistir ao chamado da boemia, ele torra todo o dinheiro com bebidas e mulheres.
A partir daí, a trama gira em torno do protagonista, personagens que ele encontra e as situações inusitadas por que passa durante sua obstinada busca para cumprir com sua promessa. Ele consegue o dinheiro, às vezes quase que por milagre, mas de uma vez. Mas, sempre que está prestes a pagar a dívida para com a santa, algo acontece.
Além de ser sua obra derradeira, o motivo de A Lenda do Santo Beberrão ser considerada a “obra testamento” de Joseph Roth também diz respeito ao conteúdo autobiográfico da novela. O protagonista da trama, nada mais é que um alter ego do autor, tendo com seu criador diversos pontos em comum. Assim como o mendigo, Roth também mantinha uma vida de andarilho. Embora sua trajetória e carreira tenham obtido reconhecimento na época, entre a Alemanha e a França, o autor nunca adotou um endereço fixo ou duradouro, viajando e passando por diversos países europeus até seus derradeiros dias. Além de religioso, como seu personagem, Roth também era alcoólatra, entre outras coisas em comum.
Adaptado para o cinema pelo diretor italiano Ermano Olmi, A Lenda do Santo Beberrão ganhou o Leão de Ouro de Veneza de 1988. O filme merece ser visto. Além de ser uma feliz adaptação, também e traz a boa interpretação do holandês Hutger Hauer como o mendigo.
Filho de uma família judaica de Brody, hoje parte da Ucrânia, Joseph Roth nasceu em 1894, nos dias finais do Império Austro-Húngaro. Além de brilhante jornalista, sua obra ficcional foi marcada por personagens à margem de uma Europa angustiada pelo pesadelo diário que marcaram os dias do período entre guerras, que o autor conseguiu retratar como poucos.
Deprimido com os acontecimentos que assolavam o continente europeu, precedendo a inevitável guerra, principalmente a ascensão do nazismo na Alemanha, e cada vez mais mergulhado no alcoolismo, Joseph Roth faleceu em Paris, em 27 de Maio de 1939.

Joseph Roth nas livrarias:
Como dito acima, apesar de sua importância e qualidades indiscutíveis, Joseph Roth parece pouco lido ou, no mínimo, menos comentado e difundido do que sua obra merece. Mas existem bons títulos do autor em nossas livrarias e, além dos dois títulos lançados pela Estação Liberdade – A Lenda do Santo Beberrão e Hotel Savoy –, sugiro outros dois ótimos livros da Companhia das Letras abaixo:

Berlim Ótimo título da não menos ótima coleção Jornalismo Literário da editora, o livro compila artigos que revelam o brilhantismo do trabalho de Joseph Roth como homem de imprensa. Aqui, o autor faz uma crônica da Berlim da década de 1920. Em suas andanças, o autor destrincha o cotidiano da antiga capital prussiana, quando coração da recém-inaugurada República de Weimar. Passeia por bosques e praças e edifícios e bondes, refletindo sobre o significado da natureza, diante da paisagem artificial da modernidade. Caminha entre bairros de imigrantes, decifra a vida noturna berlinense e visita campos de refugiados e faz um tour pela cidade ao lado de um criminoso que acaba de sair da prisão para, através da ótica de seu companheiro, compreender a medida das transformações ocorridas na metrópole.


Aqui, reencontramos o grande escritor de ficção e fascinante tradutor de seus dias. Usando como pano de fundo os dias que marcaram o início da primeira guerra, Joseph Roth narra a trajetória do judeu e muito religioso, Mendel Singer, para criar uma releitura do livro de Jó. Homem modesto e temente a Deus, Singer vive com sua família numa cidadezinha russa. Apesar de humildes, são felizes e gratos pela vida que levam. A tranqüilidade e os bons dias que Singer atribui à benevolência da Providência Divina acabam com o estouro do conflito e, assim como o personagem bíblico, o personagem descobre-se face a um teste para comprovar sua fé.