Mostrando postagens com marcador História. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador História. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Outros Carnavais



Outros Carnavais

Aproveitando as festividades de Momo, a Fundação Unesp lança três grandes obras sobre o tema em promoção imperdível.
Por César Alves

Antecipando-se às festividades carnavalescas, a Editora Unesp começa 2018 tendo como abre-alas colocando em promoção títulos de seu imenso catálogo que abordam diferentes aspectos de um tema inesgotável e muito caro à maioria dos brasileiros: o Carnaval.
Assim como o futebol, a celebração anual que vai da sexta-feira gorda à quarta-feira de cinzas não nasceu no Brasil, mas acabou por ser incorporada ao imaginário de todos os povos e nações do mundo como um de nossos mais famosos cartões de visitas.

Os carnavais de rua e dos clubes na cidade de São Paulo: metamorfoses de uma festa (1923-1938) –
O primeiro deles, Os carnavais de rua e dos clubes na cidade de São Paulo: metamorfoses de uma festa (1923-1938), escrito pela professora de História do Brasil, nos cursos de graduação e pós-graduação da Fundação Unesp, Zélia Lopes da Silva, debruça-se sobre a história do Carnaval de Rua na cidade de São Paulo, bem como os Blocos e Clubes, que marcaram os carnavais das décadas de 1920 e 1930. Fruto de uma pesquisa aprofundada em torno dos bailes, cordões e blocos de rua que puxavam as festividades pelas ruas do Centro de São Paulo e arredores, a autora teve como ponto de partida descobrir o que motivava os foliões do período, quando a metrópole ainda era conhecida como a capital do trabalho, a cidade que não para e quetais, a desatar a gravata, dar uma pausa no trabalho e trocar a carranca séria por uma máscara ou pintura de Arlequim, Pierrot ou Colombina. Aqui, a professora Zélia disseca as origens e significados das brincadeiras, festejos e cânticos mais populares durante as duas décadas, fornecendo um rico registro de um carnaval muito diferente de como hoje o conhecemos.

Festa de negro em devoção de branco: do Carnaval na procissão ao teatro no círio – Em se tratando de nossa fortuna musical folclórica e popular, poucos pesquisadores e autores fizeram tanto pela manutenção de sua memória quanto José Ramos Tinhorão. Historiador, pesquisador, colecionador e apaixonado como poucos ao objeto de sua pesquisa, Tinhorão é autor de dezenas de títulos que abordam os mais diversos aspectos e características de nossas raízes rítmicas, sonoras e líricas e sua construção, dentro do contexto histórico de formação de um patrimônio cultural ao mesmo tempo em que também tomava forma um país.
É exatamente neste contexto que se enquadra Festa de negro em devoção de branco. Resultado de um minucioso e aprofundado trabalho de pesquisa, o autor parte em busca das origens de nossa identidade cultural, a partir do encontro da cultura africana com a Lusitana. O resultado é um belo livro, rico em dados históricos, uma jornada além mar em busca do papel que o encontro e estranhamento entre duas culturas distintas, africanos e portugueses, tiveram na invenção de uma nova e diversificada identidade cultural que viria a ser brasileira.

O dia em que adiaram o Carnaval – Trazendo como subtítulo Política externa e a construção do Brasil, O Dia em que adiaram o Carnaval, do historiador Luís Claudio Gomes Villafane Gomes, usa como gancho uma curiosidade carnavalesca do início do século vinte para falar de relações exteriores e a formação de nossa formação como país.  Poucos sabem, mas, por conta do luto pela morte do Barão do Rio Branco, em 1912, quase cancelaram as folias de fevereiro. Falecido no dia 10 daquele mês, tido como herói nacional e maestro da formatação das fronteiras brasileiras, sua partida foi motivo do decreto de luto oficial, impedindo a realização das festividades. O impasse quanto ao cancelamento ou não do Carnaval daquele ano foi resolvido com uma manobra de agenda: O Carnaval aconteceria, mas no mês de abril e não em fevereiro.
O livro parte daí para destrinchar o mito do Barão de Rio Branco como artífice na criação de nossa nacionalidade e na construção de um conceito de Brasil como jovem nação, pós-independência.

Serviço:
Os carnavais de rua e dos clubes na cidade de São Paulo: metamorfoses de uma festa (1923-1938)
Autora: Zélia Lopes da Silva
268 páginas

Festa de negro em devoção de branco: do Carnaval na procissão ao teatro no círio
Festa de negro
Autor: José Ramos Tinhorão
160 páginas

O dia em que adiaram o Carnaval: política externa e a construção do Brasil
Autor: Luís Cláudio Villafañe G. Santos
280 páginas
Editora Unesp


domingo, 27 de agosto de 2017

O Itinerário de Benjamin de Tudela - Livro



A Jornada de Benjamin

Depoimento histórico de valor inquestionável e obra inaugural do gênero literário de relatos de viagens, O Itinerário de Benjamin de Tudela, aporta nas livrarias brasileiras.
Por César Alves

Talvez um dos mais importantes registros sobre as rotas de comércio e o modo de vida dos povos da Europa, África e Ásia, durante a Idade Média, O Itinerário de Bejamin de Tudela chega às livrarias brasileiras numa bela edição da editora Perspectiva sob a dedicação e os cuidados do professor Jacó Guinsburg.
Baseada nas anotações feitas pelo rabino Benjamin (1130-1173) que, em meados do século XII, teria empreendido uma jornada de aproximadamente uma década através dos territórios citados – no período que coincide com a conquista da Península ibérica, entre a segunda e a terceira Cruzadas, e antes da ascensão de Saladino –, a obra surpreende por anteceder em aproximadamente cem anos As Viagens de Marco Polo, famoso relato do mercador, embaixador e explorador veneziano.
Partindo de Tudela, ao norte da Espanha, rumo à Terra Santa, o que deveria ser uma rápida viagem de alguns meses, acabou se transformando numa aventura muito além da planejada peregrinação à Jerusalém, com longas escalas durante as quais o rabino Benjamin procurou visitar comunidades judaicas e não judaicas, informando-se sobre seu estilo de vida, os governos vigentes, suas tradições, cultura, economia e, acima de tudo, suas populações.
A narrativa revela o olhar atendo do viajante maravilhado diante de tudo o que vê, o que a torna uma espécie de Guia de viagens, repleto de endereços úteis, para os peregrinos judeus do período, contendo informações sobre as cidades que ofereciam hospitalidade aos viajantes, como Montpellier, Gênova e Constantinopla, por exemplo.
Aqui também são descritas as condições econômicas dos mercadores de Barcelona, Montpellier e Alexandria, e também quais eram as principais atividades dos judeus, descrevendo o dia a dia dos tintureiros em Brindisi, tecedores de seda em Tebes, curtidores de couro em Constantinopla e vidraceiros em Alepo e Tigre. O relatório também inclui informações demográficas sobre as comunidades judaicas de algumas cidades da época: 20 judeus em Pisa, 40 em Lucca, 200 em Roma, 300 em Cápua, 500 em Nápoles, 600 em Salerno, 20 em Amalfi, entre outras.
Em seu diário de viagem, o rabino tomou o cuidado de registrar os nomes das principais lideranças comunitárias das regiões por onde passou; das cidades que possuíam boas escolas para estudos judaicos, como Montpellier, ou como Lunet, onde a comunidade subsidiava a educação dos jovens. Mencionou, também, a existência de uma escola de medicina cristã em Salerno e chamou-lhe a atenção, por exemplo, os acadêmicos de Constantinopla por serem dotados de um profundo conhecimento da literatura grega.
Durante sua viagem, Benjamin visitou igrejas e mesquitas. Descreveu Roma como “a capital do cristianismo, governada pelo papa, seu líder espiritual”. Constantinopla, em suas palavras, “sedia o trono dos patriarcas gregos, pois estes não obedecem ao papa”. Em suas andanças descobriu, ainda, que as cidades de Trani e Messina eram os principais pontos de partida dos peregrinos cristãos à Terra Santa.
Compondo um panorama histórico e geográfico de seu tempo, O Itinerário de Benjamin de Tudela confirma-se como registro histórico de relevância inquestionável. O livro deve agradar muito os historiadores e pesquisadores da Idade Média, mas também pode ser apreciado pelos leitores comuns que certamente irão se sentir parte da jornada realizada pelo rabino Benjamin, seduzidos pelo deleite da escrita de fácil leitura e a riqueza de seus relatos.

Serviço:
O Itinerário de Benjamin de Tudela
Organização e Tradução: J. Guinsburg
Editora: Perspectiva
160 páginas




sábado, 3 de dezembro de 2016

Histórias da Mesa - Massimo Montanari



Casos gastronômicos saborosos

Livro de Massimo Montanari reúne histórias curiosas dos séculos XIII ao XVII sobre nosso comportamento à mesa.
Por César Alves

Na Nápoles do século XIV, durante uma refeição oferecida pelo rei Roberto I a Dante Alighieri, o monarca teria ficado espantado com o comportamento nada convencional do poeta à mesa. Rompendo com todos os protocolos de bons modos, principalmente diante de um membro da realeza, o autor de A Divina Comédia esfregava carne e vinho nas próprias vestimentas.
Em Rivotorto, por volta do ano de 1225, Francisco de Assis pretendia suplicar ao imperador que lançasse um édito geral, obrigando todos que tivessem recursos a espalhar trigo e grãos pelas ruas para que “os passarinhos e as irmãs cotovias pudessem tê-los em abundância”, como parte de sua concepção do que seria uma verdadeira ceia de Natal. Um banquete geral, no qual os pobres e os mendigos fossem saciados pelos ricos e que mesmo os animais comecem mais.
As duas histórias, aqui bem resumidas, são exemplos de alguns dos casos deliciosos e curiosos reunidos pelo historiador e pesquisador, Massimo Montanari no ótimo livro Histórias da mesa, que acaba de sair no Brasil.
Dividido em 22 capítulos, o livro traz casos – alguns verídicos, outros um tanto quanto duvidosos – pinçadas pelo autor de registros históricos que vão do século XIII ao XVII. Alguns, como os citados acima, protagonizados por celebridades históricas, outros tendo como personagens figuras anônimas.
Aqui ficamos sabendo como, durante a celebração de um casamento, os convidados foram intimados a comparecer diante dos magistrados, em até três dias, para se defender das infrações contra a “Sereníssima”, tendo como prova do crime a carne de caça na mesa e as espinhas de peixe das sobras. “Não sabeis que, nos banquetes de núpcias, é proibida a mistura de carne e peixe?” Observava a acusação.
Professor de história medieval na Universidade de Bolonha, Itália, Massimo Montanari é pesquisador gastronômico e organizador de História da Alimentação (Estação Liberdade) e O mundo na cozinha – História, identidade, trocas (Estação Liberdade e Editora Senac-SP).

Serviço:
Histórias da Mesa
Autor: Massimo Montanari
Tradução: Federico Carotti
Editora: Estação Liberdade

232 páginas

(Publicado originalmente na edição número 27 da revista Cenário - www.revistacenario.art.br)


terça-feira, 18 de agosto de 2015

O Coração das Trevas em Quadrinhos e o Holocausto Negro do Congo



As Profundezas do Lobo do Homem no Congo Belga e Joseph Conrad em Texto e Imagem

Fruto da experiência pessoal de Joseph Conrad, durante sua estadia no Congo, em plena colonização genocida belga e um dos mais intensos cânones da literatura universal, O Coração das Trevas, ganha adaptação para quadrinhos.
Por César Alves

Certa manhã, no limiar do século XX, missionários europeus, dedicados a espalhar a boa nova entre os selvagens da África e salvar da danação suas pobres almas condenadas, receberam um cesto pesado. A princípio, acreditaram tratar-se de um presente, uma demonstração de gratidão dos nativos aos arautos da santidade entre os homens.
O Horror! Não eram frutas nativas.
O Horror! Estava cheia até a borda.
O Horror! Dezenas de mãozinhas negras decepadas.
O Horror! Membros, separados dos corpos de crianças nativas, para castigar seus pais rebeldes.
O Horror! O conteúdo do cesto era o resultado de mais de duas décadas da colonização belga, perpetradas pelos homens de boa vontade.
O Horror! Um dos maiores e mais terríveis massacres, hoje esquecido pelos livros de história.
O Horror! Cerca de 13 milhões de mortos!
O Horror! O silêncio sepulcral de Deus quase tão sombrio quanto o silêncio dos homens de bem, frente aos massacres em nome civilização e do progresso.
Apelidado de “O Açougueiro do Congo”, foi como filantropo, o bom monarca que, em socorro ao sofrimento do povo africano, empreende uma missão civilizadora e humanitária para curar os doentes, educar os ignorantes e alimentar os famintos do Congo, Leopoldo II assumiu um dos poucos territórios ainda inexplorados, durante o neo-colonialismo europeu na África.

Terreno difícil, selva invencível, o Congo era o inferno, mesmo para exploradores experimentados. No final do século XIX, ainda evitado pelas nações ricas que investiam e lucravam com a exploração das riquezas dos territórios vizinhos.
Ambicioso, Leopoldo II chegou ao poder como o soberano que iria mudar o papel de seu país na história. A Bélgica havia ficado de fora da colonização do Novo Mundo, era vista como uma nação pacífica e próspera, mas sem grande atuação no jogo político internacional. Vencer o inferno do Congo poderia ser a cartada definitiva para mudar o jogo. Mas a empreitada era por demais arriscada. As chances de fracasso eram imensas e, ainda que obtivesse sucesso, os lucros certos com as riquezas naturais levariam tempo para cobrir as despesas da aventura.
Para evitar jogar a conta no tesouro belga, o rei arquitetou um plano para financiar equipamentos, armas e mão de obra, sem tirar do próprio bolso. Fundou, em seu nome e em nome de seus parentes, diversas associações filantrópicas de fachada e, através delas, arrecadou os fundos necessários, sob a alegação de tratar-se de uma expedição humanitária. Algo bem parecido com o golpe de políticos, ativistas inescrupulosos e ONGs falsas de hoje em dia. Na verdade, sua majestade tinha verdadeiro interesse era na riqueza de marfim e extração de borracha – o potencial das riquezas minerais da região ainda não tinha sido percebido, mas o leitor não está errado se pensou nos “Diamantes de Sangue”, que não é nada mais do que um dos capítulos mais recentes dessa mesma tragédia.
Os trinta anos de dominação belga no Congo, resultou num número aproximado de 13 milhões de mortos. Portanto, quando você pensar nos grandes genocídios da história, lembre-se também do Holocausto Negro no Congo; quando falarem em campos de trabalhos forçados e de extermínio, pense no estupro de mulheres negras liberados para soldados e emissários do rei e no único caso conhecido na história de um povo e um país inteiro como propriedade e mão de obra escrava de um individuo, o Rei Leopoldo.
Quando ler sobre a crueldade perpetrada por grupos paramilitares, milicianos e guerrilheiros nas florestas africanas de hoje, pense no “Manual de Dominação e Condicionamento”, elaborado pelos alto-funcionários da coroa belga em fins do século dezenove, que incluía tortura, desmembramento, decapitação e cabeças enfiadas em estaca, como forma de imposição da ordem, ainda hoje usado para educar os integrantes dos grupos citados anteriormente.

O horror, segundo Joseph Conrad, em quadrinhos
Ainda hoje praticamente ignorado pelos livros de história, a tragédia colonial do Congo não passou despercebida pela literatura e acabou gerando uma das obras mais importantes de literatura universal, através da pena mestra de Joseph Conrad, autor de O Coração das Trevas e testemunha ocular do massacre – Conrad seguiu a carreira de marinheiro por 16 anos, experiência que foi base para sua obra. Em um de seus últimos empregos marítimos, o autor trabalhou para uma empresa de exploração belga, justamente conduzindo um barco a vapor através do Rio Congo. O período de dominação de Leopoldo II.
A obra, que já ganhou duas adaptações para cinema e pode ser encontrada em diversas traduções em nossas livrarias, acaba de chegar às nossas prateleiras em adaptação para os quadrinhos.
Roteirizado pelo premiado dramaturgo norte-americano, David Zane Mairowitz, com desenhos de Catherine Anyango, do Royal College of Arts of London, e tradução para o português de Ludimila Hashimoto, no ótimo lançamento da heróica editora Veneta.

Inspiração para o roteiro de Apocalypse Now de Francis Ford Coppola, O Coração das Trevas narra a saga do capitão Charles Marlow e sua busca pelo misterioso senhor Kurtz. Lobo do mar e aventureiro, Marlow se vê entediado após longo período sem trabalho. Para quem tem em um navio seu único lar e na vastidão do mar sua única pátria, nada pior que terra firme. Contratado por uma companhia inglesa de exploração de marfim, Marlow assume o comando de um barco a vapor. É enviado a uma colônia africana para, pelo rio, transportar de um posto a outro o produto extraído da selva. Antes, no entanto, é incumbido de resgatar o senhor Kurtz, funcionário que dirige o posto mais produtivo, localizado na parte mais alta e inóspita da rota. A busca por Kurtz mergulha Marlow em uma jornada sombria em direção às profundezas da selva e da alma humana.


Serviço:

Título: O Coração das Trevas
Autores: Joseph Conrad, David Mairovitz e Catherine Anyango
Editora Veneta
128 páginas




segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Histórias Curiosas da Segunda Guerra Mundial - Livro



Lendas e Curiosidades de um Conflito
Historiador espanhol compila curiosidades fatuais, mitos e lendas da Segunda Guerra Mundial em livro.
Por César Alves

Para muitos, a Segunda Guerra Mundial é apenas o capítulo mais marcante de um conflito iniciado com a explosão da primeira e que, ao contrário do que os livros da história podem nos induzir a acreditar, não teria terminado com a derrota dos países do Eixo, mas prosseguido com a Guerra Fria. Desse ponto de vista, crises bélicas, como a recente tensão na Ucrânia e o – ainda longe de alcançar uma solução pacífica – conflito Israel e Palestina, seriam continuação de um mesmo momento histórico e, dessa forma, teria durado por todo o século passado e ainda continuaria viva, nos dias de hoje.
Teorias históricas a parte, certo é que a Segunda Guerra sempre irá atrair nossa atenção devido ao que tem de monstruoso, heróico, exemplo de superação e do que a humanidade possui de melhor e pior e como tais características afloram e se mostram claras durante momentos de crise.
Talvez, isso explique porque o conflito ainda ser tão presente em nossas vidas e continua sendo assunto inesgotável para livros; tanto factuais quanto ficcionais, filmes; documentários, cinebiografias e pano de fundo para roteiros de aventura, dramas históricos e até comédias. Tanto para aqueles que viveram o período, quanto para os nascidos depois, o último grande confronto global faz parte do inconsciente coletivo de nossa civilização, e continua atraindo atenção pelo impacto causado na ordem geopolítica de seu tempo e que ainda reverbera em nossos dias, pelos fantasmas que deixou e sempre voltam para nos assombrar, por seus protagonistas notórios e sua atuação, mas também pelo que tem de mítico e curioso.
É justamente sobre o lado mítico, lendário e curioso do evento que se debruça o historiador e jornalista espanhol, Jesús Hernández, autor de Historias Curiosas da 2ª. Guerra Mundial, que acaba de ganhar edição brasileira.
Ao contrário de outros livros sobre o tema, o autor aqui passeia por personagens – anônimos e notáveis – que, de uma forma ou outra, estiveram envolvidos, como protagonistas de momentos decisivos ou apenas coadjuvantes, lançados em meio ao furacão bélico por circunstâncias diversas. Trata-se de uma coleção de histórias pouco exploradas como a paixão de Hitler pelo busto de Nefertiti, ao ponto de arriscar perder um aliado e ponto estratégico importante, criando um mal estar com o Egito, ao se recusar a devolver a peça ao Museu do Cairo; o uso do carro de Al Capone por Roosevelt e o papel de mafiosos, como Lucky Luciano, na tomada da Itália, aqui são explorados, revelando o que possuem de lenda e fato.
Apesar de manter a seriedade que o tema merece, a obra oferece uma leitura diferente da maioria dos livros sobre a 2ª. Guerra com os quais estamos acostumados. Sua escrita simples e a narrativa fazem de Historias Curiosas da 2ª. Guerra Mundial excelente leitura tanto para leigos quanto especialistas. Leitura agradável para o leitor comum e também fonte de pesquisa para estudiosos.
Se nada disso despertou a curiosidade, do amigo ou amiga, para conferir o livro, quando se deparar com ele nas prateleiras de sua livraria predileta, talvez, histórias com a descrita abaixo o faça:

Picasso e o Oficial Nazista
Contrariando os conselhos de amigos e colaboradores, Pablo Picasso, um dos muito residentes ilustres de Paris, decidiu que ficaria na França, mesmo depois da invasão alemã, em 1942. A retomada das hostilidades, apesar do armistício assinado por ambas as nações três anos antes, e o conhecido tratamento dado pelas forças nazistas aos que não concordavam com sua doutrina, como era o seu caso, eram motivos mais do que suficientes para que tal atitude fosse vista como ato suicida ou de muita coragem – verdadeira insanidade, para muitos.
Apesar de declarar-se abertamente contrário aos nazistas, o artista, no entanto, foi poupado das perseguições pelo governo invasor, devido à popularidade e o respeito que tinha mundo afora, defendem historiadores. O que não o livrou de ser alvo de vigilância constante. Afinal, embora não tenha chegado a integrar as fileiras da Resistência Francesa, Picasso não escondia seu apoio e era visto como um companheiro de luta pelos que integravam a causa.
Na esperança de convencê-lo a mudar de lado e, assim, poder contar com o apelo propagandístico que seu nome poderia angariar para a popularidade do novo governo, políticos e oficiais alemães tentavam seduzi-lo com mimos, privilégios e presentes – principalmente, material de pintura, muito escasso, devido à guerra. Tais visitas ao ateliê do pintor eram quase diárias, nas quais faziam elogios, reforçavam sua admiração por seu trabalho e pareciam irritar profundamente Picasso.
Numa delas, conta-se que Otto Abetz, embaixador Alemão em Paris, durante a ocupação, teria apontado para a reprodução de uma obra, exposta em uma das paredes, e perguntado:
_ Obra sua, mounsier Picasso?
_ Não. Obra sua!
Respondeu o artista.
Tratava-se de uma reprodução de Guernica, obra-manifesto contra a desumanidade da guerra, pintada por Picasso após o bombardeio sofrido pela cidade basca, em 26 de abril de 1937, perpetrado por forças alemãs.
*.*
Se o diálogo e a situação realmente aconteceram, a história acima é, no mínimo, um deleite, tanto como mito, quanto como fato histórico.

Serviço:
Título: Histórias Curiosas da 2ª. Guerra Mundial
Autor: Jesús Hernández
Editora: Madras
340 páginas