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quarta-feira, 15 de abril de 2015

William Eggleston - A Cor Americana



América de Todas as Cores

Provavelmente, mais conhecido no Brasil pelas capas de discos de artistas como Big Star e Primal Scream, maior exposição individual já realizada de William Eggleston,  A Cor Americana, é exibida no Instituto Moreira Salles.
Por César Alves


Meu primeiro contato com a fotografia de William Eggleston se deu atravéss da musica. Eggleston é responsável pelas imagens que ilustram a embalagem de diversos álbuns que fizeram minha trilha sonora pessoal – entre suas capas mais famosas, estão a de Radio City (1974), do Big Star, e Give Out But Don´t Give Up (1994), do Primal Scream. Desde que seu admirador e amigo, Alex Chilton, utilizou uma de suas imagens icônicas para ilustrar a capa do cultuado segundo disco de sua não menos cultuada banda, suas fotos apareceram em tantas outras que muitos o consideram The King of the Album Cover Photo. Não deixa de ser uma verdade, mas limitar seu trabalho a isso é também reducionismo. Sua fotografia é muito mais, como atesta a exposição William Eggleston, a Cor Americana,  que o Instituto Moreira Salles exibe até 28 de junho, no Rio de Janeiro.

Reunindo 172 obras do acervo de instituições renomadas como o Museu de Arte Moderna de New York e o Museum of Fine Arts de Houston, além de itens da coleção pessoal do artista e das galerias Cheim & Read e Victoria Miro, a mostra representa a maior exposição individual do artista já realizada no mundo.
Considerado um dos maiores nomes da fotografia americana da segunda metade do século XX, Eggleston costuma ser associado ao grupo de fotógrafos – entre eles William Klein, Robert Adams, Martin Parr, Jurgen Teller, entre outros –, surgidos durante o pós-guerra, dotados do mesmo inconformismo e desconfiança em relação a hipocrisia da sociedade e de seus líderes. Decididos a não desperdiçar suas vidas, como os garotos, pouco mais velhos do eles, lutando uma guerra sem sentido, assim como seus colegas geracionais literários, os Beatniks, empreenderam uma viagem aos cantos mais obscuros dos Estados Unidos para registrar a América Profunda, munidos de suas máquinas e o desejo de descoberta.
A jornada de Eggleston, no entanto, começa nas dependências de seu próprio quintal. Nascido em Menphis, Tennesee, cresceu sob o ambiente marcado pela tensão racial, indignado com a desigualdade social de uma região, ainda fortemente presa a seu passado escravocrata, e seduzido pela beleza das pessoas simples e a musica. Entre 1960 e meados da década seguinte, o fotógrafo se dedicou a registrar, ainda sem pretensões artísticas, o universo do Sul do país, em cujo entorno, atuavam personagens como Martin Luther King e Elvis Presley, mas, principalmente, as pessoas comuns e a vida simples nos subúrbios.

O fotógrafo é reconhecido por abrir novas fronteiras para o gênero fotográfico. Marcadas por cores vibrantes, suas imagens vão além do registro cotidiano e dos personagens que protagonizavam o momento histórico, marcado pela ambição de um país recém-saído de uma campanha vitoriosa no maior conflito bélico jamais visto, como líder das nações livres, e decidido a assumir como missão abraçar a promessa grandiosa do futuro, fazendo vista grossa para as falhas de seu passado. Sendo assim, a lente de Eggleston também mirava carros, outdoors, fachadas de supermercados e outros objetos que representavam a sociedade de consumo capitalista e sua modernidade em contraste com sua realidade desigual e anacrônica.
Há uma canção de Neil Young que diz: “there´s more to the Picture than meets the eye”. Poucos artistas me remetem tanto ao verso do que Eggleston. Especialista em revelar a intensa maravilha do óbvio, esse “mais” de que fala Young e que suas imagens nos induzem a procurar está sempre presente, embora nunca de forma explícita. Ele fotografa o que vê, mas parece ter o foco no que está além dos olhos. Pelo menos, é a impressão que temos ao passear pela exposição e folhear o belo catálogo que a acompanha.
Como o amigo aqui escreve mais como admirador do que verdadeiro especialista na área, talvez não tenha ficado claro o que tentei dizer no último parágrafo. Sendo assim, aproveito para sugerir um documentário sobre o fotógrafo, disponível na internet, William Eggleston in The Real World, de Michael Almereyda, de 2005.
O diretor do filme se propõe a acompanhar o fotógrafo para registrar seu processo criativo. É na simplicidade com que ele passeia, acompanhado apenas de seu filho, Winston, como ajudante, por lojas, praças e ruas, conversando com gente que passa, observando um poste de luz, um cachorro ou uma escada, é que temos a certeza de que, naquela foto conhecida e que faz parte da exposição do IMS, há muito mais do que um triciclo infantil, largado sozinho.
Com curadoria de Thyago Nogueira, fico na torcida para que a mostra chegue a São Paulo e outras cidades. O Livro-catálogo, de mesmo título, também vale a pena o investimento. Além de reprodução das obras que fazem parte da mostra, traz textos inéditos de David Byrne, Geoff Dyer, Richard Woodward e do curador, Thyago Nogueira.






Serviço:

Exposição:
William Eggleston, a Cor Americana
Local: Instituto Moreira Salles
Endereço: Rua Marques de São Vicente, 476 – Gávea – Rio de Janeiro – RJ

Livro:
William Eggleston, a Cor Americana
Vários Autores
Editora: IMS






segunda-feira, 13 de abril de 2015

Geraldo de Barros e a Fotografia



Geraldo de Barros e a Fotografia
Chega a São Paulo a maior exposição já realizada sobre a obra de Geraldo de Barros.
Por César Alves

Desde a semana passada – depois de passar com sucesso pelo Rio de Janeiro –, uma exposição, no mínimo, imperdível para os amantes da fotografia, arte e experimentação gráfica está em São Paulo. Com curadoria da pesquisadora e coordenadora de artes visuais do Instituto Moreira Salles, Heloísa Espada, Geraldo de Barros e a Fotografia é uma parceria do IMS com as Organizações Sesc e reúne cerca de 300 obras do pintor, designer e fotógrafo paulista, divididas em três ambientes da unidade do Sesc Belenzinho.

Parte da geração de artistas surgidas na esteira das propostas idealizadas pelos Modernistas nas primeiras décadas do século vinte, Geraldo de Barros inicia sua produção em fins da década de trinta, tendo como marca o gosto pela experimentação e a liberdade desenvolta em relação a linguagens, estilos e formatos. Nome dos mais significativos dentro da construção de uma linguagem moderna e diálogo em sintonia com as vanguardas artísticas internacionais no contexto da arte brasileira, Barros esteve diretamente envolvido com movimentos importantes, como o concretismo, e participou ativamente dos grupos Ruptura e Rex.
Reunindo de forma cronológica fotografias, desenhos, gravuras, monotipias e pinturas – concretas e flertes com o Pop –, a exposição oferece uma rara oportunidade de compreender como se deu o processo criativo e evolutivo, durante a construção de uma obra única.
É o que se percebe ao visitar a sala dedicada a série Fotoformas, com peças que formaram a histórica exposição Fotoforma, realizada em 1951, no Masp, ainda em seu primeiro endereço provisório na rua 7 de Abril, no centro de São Paulo.
A exposição conta também com 268 colagens de negativos e 70 ampliações da série Sobras, do final de da trajetória do artista.

Dono de uma visão que ia além do universo artístico, suas preocupações sociais e o desejo de levar sua arte a extremos que iam além dos museus e espaços tradicionais, em 1956, junto com Frei João Batista, Barros fundou a Unilabor, cooperativa que fabricava móveis e mantinha uma escola de arte e um posto de saúde. Ao lado de Alexandre Wollner e Rubem Martim, Geraldo de Barros também esteve a frente do primeiro escritório de design brasileiro, quando, em 1957, fundou a Form-Inform.

Livro
 Recentemente, o Instituto Moreira Salles recebeu cerca de dois mil itens que fazem parte da obra de Geraldo de Barros, tornando-se referência na pesquisa sobre o artista. O material faz parte de sua faceta fotográfica, composto das séries Fotoformas (1940-1950) e Sobras (1996-1998).
Para celebrar a aquisição, além da exposição, o Instituto Moreira Salles, em co-edição com as Edições Sesc-SP, também lança o livro-catálogo Geraldo de Barros e a Fotografia. Belo no formato e rico em conteúdo, a obra se destaca como referência das mais ambiciosas sobre o artista, reunindo reproduções de seus trabalhos e trazendo novos dados sobre sua biografia e temas pouco abordados em trabalhos anteriores, como sua atuação no Foto Cine Clube Bandeirante.
O livro traz também textos, produzidos exclusivamente para compor a obra, escrito por especialistas como Heloísa Espada, Tadeu Chiarelli, Simone Forster, João Bandeira e Giovanna Bagaglia.

Serviço:
Exposição
Geraldo de Barros e a Fotografia (de 7 de abril a 31 de Maio)
Sesc Belanzinho
Endereço: Rua Padre Adelino, 1000
Telefone: (11) 2076-9700

Livro
Geraldo de Barros e a Fotografia
Autor: Vários
Editora: co-edição IMS e Edições Sesc-SP
300 páginas


segunda-feira, 30 de junho de 2014

Artigo - Jorge Schwartz



Entre as Vanguardas do Novo Mundo e transformistas do submundo

Jorge Schwartz aborda as vanguardas Latino-Americanas e o submundo paulistano no trabalho de sua mãe, a fotógrafa Madalena Schwartz.
Por César Alves

Diretor do Museu Lasar Segall desde 2008 e também professor titular de literatura hispano-americana da USP, Jorge Schwartz é um incansável estudioso, pesquisador e crítico de arte. Com principal foco nas produções latino-americanas, ele é autor de incontáveis livros e artigos sobre artes visuais e literatura, além de possuir um currículo de fazer inveja como curador de diversas e importantes exposições.
Nascido em 1944, sua colaboração para com o segmento que escolheu como objeto de estudo e atividade profissional possui diversidade, constância e quantidade de formatos o suficiente para imaginar que o autor pouco tenha descansado nas últimas décadas, tornando quase impossível encontrar outra palavra que descreva sua relação com o universo das artes além de paixão. São frutos dessa paixão dois títulos que trazem sua assinatura, que recentemente chegaram às nossas livrarias. 
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O primeiro deles, lançamento fresquinho da Companhia das Letras, chama-se Fervor das Vanguardas. Se o título não diz muito ou até pode fazer com que alguns leitores torçam o nariz, devido ao número de picaretagens pretensiosas associadas à palavra “vanguarda” que hoje aparecem em nossas livrarias e salas de exposições, o subtítulo talvez deixe mais claro do que se trata e explique sua importância: Arte e Literatura na América Latina.
O tema não é novidade para o autor dos importantes Vanguardas Latino-Americanas e Vanguardas Argentinas – o segundo escrito em parceria com May Lorenzo Alcala –, ambos lançados pela Editora Iluminuras. Fervor das Vanguardas chega para ser associado a estes títulos e enriquecer ainda mais a bibliografia sobre o assunto em nossas prateleiras. A obra reúne uma série de ensaios e artigos de Schwartz produzidos ao longo dos últimos anos.
Autor de estudos aprofundados sobre as obras de Oswald de Andrade e Oliverio Girondo, dois dos nomes mais emblemáticos das vanguardas do Brasil e Argentina, ambos aparecem aqui em novos textos que abordam aspectos específicos de seus trabalhos e sua importância. É justamente Oswald um dos protagonistas do artigo que abre o livro, o ótimo Tarcila e Oswald na sábia preguiça solar, que traça um estudo sobre a colaboração conjugal e artística do casal emblemático do Modernismo Brasileiro, batizado por Mario de Andrade de “Tarciwald”. Mario, que assim como Oswald figura em vários dos textos que compõe a obra, também teria sido um dos primeiros a estabelecer uma ponte entre os modernistas brasileiros e argentinos, divulgando por aqui os nomes de Jorge Luis Borges e Oliverio Girondo, poeta que, antes dos beatniks e da contracultura, empreendeu uma jornada pelo Oriente no início dos anos 1920, como ficamos sabendo em Ver/ler: O júbilo do olhar em Oliverio Girondo.
Merece destaque o artigo Surrealismo no Brasil?: Décadas de 1920 e 1930. O texto parte da estadia do surrealista francês Benjamin Péret no Rio de Janeiro e em São Paulo entre os anos de 1929 e 1931, quando se casou com a cantora brasileira Elsie Houston,  vinculada a Heitor Villa-Lobos, e estabeleceu relações e colaborou com expoentes de nosso modernismo até ser expulso do país devido a sua ação política com o trotskismo – Perét chegou a ser preso em sua segunda visita em 1956, quando veio assistir ao casamento de seu filho –, para falar do flerte de nossos artistas com o Movimento liderado por André Breton. Schwartz assinala o embarque na aventura surrealista de nomes como Ismael Nery, Cícero Dias, Vicente Rego Monteiro, Tarcila do Amaral, Flávio de Carvalho (“um antropófago avant la lettre”) e Jorge de Lima, entre outros, mas responde à questão que da título ao artigo concluindo que não existe um surrealismo brasileiro, mas sim obras de artistas nacionais de inspiração surrealista.

Também discute a reivindicação de Vicente Rego Monteiro de ter sido ele o precursor da Antropofagia modernista e a obra do lituano radicado no Brasil, Lasar Segall – tema de três capítulos do livro –, como ponto de confluência de um itinerário afro-latino-americano nos anos 1920.
Verdadeiro passeio em busca de pontos em comum entre as produções artísticas de vanguarda do Brasil, Argentina e Uruguai, o livro traz 128 páginas só com reproduções das obras citadas. Além dos nomes acima, a obra também vislumbra os trabalhos do uruguaio Joaquím Torres García e dos argentinos Xul Solar e Horácio Coppola.

Filho da fotógrafa Madalena Schwartz (1921-1923), Jorge também assina a curadoria da exposição Crisálidas, reunindo trabalhos de sua mãe. Moradora do Edifício Copan na década de 1970, Madalena focou seu olhar sob os personagens do Centro de São Paulo. São da época os cliques de transformistas, travestis e performers que compõem a mostra que fica no Museu da diversidade até setembro. A exposição acabou gerando também um livro que reúne 100 fotografias, com destaque para os ensaios com Ney Matogrosso na fase-Secos & Molhados e os Dzi Croquettes, todas extraídas dos mais de 16 mil negativos que fazem parte do acervo do Instituto Moreira Salles que também edita a obra.
De origem húngara, Madalena Schwartz descobriu a fotografia por acaso, depois de o filho Julio ganhar um prêmio do programa de Bibi Ferreira na extinta Tv Excersior. Com o dinheiro, ele comprou uma câmera, mas foi sua mãe quem se interessou pelo aparelho. Da simples necessidade de registrar seu olhar afetivo sobre a cidade, a fotografia acabou por se tornar profissão. Em sua carreira, Madalena Schwartz passou por publicações como as revistas Claudia, Planeta, Status, Lui e Vogue.

Serviço:

Livros: Fervor das Vanguardas, Jorge Schwartz, Companhia das Letras, 376 páginas. Crisálidas, Madalena Schwartz, Editora IMS, 136 páginas.

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Paulo Mendes Campos A Vida Não Vale Um Cronista


 
 
Paulo Mendes Campos e a vida quando não vale um cronista
por César Alves

Em 1962, sob o acompanhamento de um médico, Paulo Mendes Campos experimentou ser invadido pelo “jorro caótico” advindo das comportas abertas pelo LSD. A experiência teria feito o cronista sentir “o peso e a nitidez das palavras”, produzindo um “milagre da voz”. Relatado em artigos da época publicados na revista Manchete – depois reproduzidos nos livros O Colunista do Morro e Trinca de Copas –, o experimento foi para ele como encarnar São Francisco de Assis falando com o Lobo, “na falta de uma comparação que preste”. E concluía: “O lobo também sabe que amor com amor se paga”.

Não se engane o leitor desavisado, pensando tratar-se de um expoente da contracultura brasileira. Paulo Mendes Campos é um dos principais nomes de nossa crônica. Para muitos, tão importante quanto Rubem Braga. Viveu e, em sua escrita, fez viver seu tempo como poucos. Incluindo-se ai as promessas de descoberta interior e autoconhecimento dos paraísos artificiais. Embora apenas uma pequena passagem dentro de uma biografia admirável, o episódio lisérgico, no entanto, talvez sirva para definir a obra atual, multifacetada e não menos admirável, dela advinda. Correndo o risco pretensioso de profanar as palavras do próprio autor, sua crônica é como um jorro caótico em intensidade, diversidade de temas, lirismo e criatividade; nitidez da palavra que se faz texto simples, sem ser banal, e culto – quase erudito –, sem ser boçal; é o milagre da voz da inteligência, sagacidade, humor e sensibilidade. Como o lobo, Paulo Mendes Campos não só sabia que amor com amor se paga, como também sabia de mais algumas (muitas) outras coisas.

Estivesse vivo para ler este artigo, talvez Paulo Mendes desse um gole de seu uísque e, com um sorriso maldoso, dissesse que, assim como a tentativa dele descrever a viagem psicodélica, tal comparação também “não preste”. Cabe-nos, então, recolhermo-nos em nossa insignificância e concluir que ao leitor bom mesmo é ir provar direto de seu barato. Sendo assim, mais que uma grata surpresa é saber que sua obra aos poucos volta às nossas livrarias em novas edições publicadas pela Companhia das Letras.

Já estão disponíveis os dois primeiros títulos, O Amor Acaba e O Mais Estranho dos Países, que revelam uma crônica rica na diversidade de temas e ainda extremamente atual, apesar de algumas delas terem sido escritas há mais de meio século. Outra característica marcante é o lirismo poético e filosófico de sua escrita, que, mais que um passeio pelo cotidiano, é um passeio pela alma humana. “As crônicas são servidas por uma erudição fluida que confere a elas a transcendência que é própria dos bons ensaios. Não é só um bom e bem humorado comentarista do cotidiano. Ele enfrenta dúvidas existenciais e filosóficas com doses certas de ceticismo. Sua prosa é decantada em invenção poética e é isso que dá a seu estilo uma marcante peculiaridade”, diz o jornalista Flávio Pinheiro, organizador do projeto.

Segundo Pinheiro, a série pretende resgatar não só sua escrita em prosa, como a poética, faceta pouco conhecida do autor. “Paulo tem claros compromissos com a poesia. Escreveu poesia de primeira qualidade. Leu todos os grandes poetas. Foi esplêndido tradutor de poesia. Eu diria que a poesia o tempo todo fecunda sua prosa. E há mesmo certas crônicas que são pura prosa poética, no melhor sentido do termo, como "O amor acaba". Mas se a prosa está muito contaminada pela poesia, sua poesia tem uma dicção particular”.

Também diretor geral do Instituto Moreira Salles, o jornalista está diretamente ligado ao projeto de catalogação do acervo de Paulo Mendes Campos que o instituto detém desde 2011. “O trabalho de catalogação ainda está em fase inicial. Um item do acervo que nos chama atenção são os diversos cadernos escritos a mão por Paulo Mendes Campos com anotações variadas que prefiguram temas de crônicas e outras observações”. Ano passado, o IMS publicou a bela Carta a Otto – Um Coração de Agosto, missiva escrita por Mendes Campos ao amigo Otto Lara Resende o que abre expectativas sobre futuros lançamentos envolvendo s registros pessoais do cronista, embora ainda não haja projetos em andamento neste sentido.

Um dos lendários “vintanistas” de Mario de Andrade ou os “quatro cavaleiros de um íntimo Apocalipse”, como definiu Otto Lara Resende, Paulo Mendes Campos nasceu em Belo Horizonte no ano de 1922. O grupo de jovens autores mineiros que, além dele e Lara Resende, também contava com Fernando Sabino e Helio Pellegrino, migrou para o Rio de Janeiro, onde ajudaria a renovar as letras e o jornalismo brasileiro na segunda metade do século vinte. Entre nossos cronistas, é comum dizerem que Paulo Mendes Campos foi injustiçado em sua época. “Não há dúvida que a obra de Paulo Mendes Campos mereceria ser mais conhecida porque se trata de um escritor ótimo e singular. Este clamoroso esquecimento está sendo sanado pelas reedições da obra. Mas soa estranho que ele tenha uma fortuna crítica tão escassa, mesmo quando comparada a de outros cronistas”, observa Flávio Pinheiro.

Devolver a um dos maiores nomes de nossa crônica seu lugar de direito e oferecer às novas gerações a oportunidade de ter contato com a obra de Paulo Mendes Campos, desde já, faz do projeto uma das melhores novidades literárias do ano.

Serviço: O Amor Acaba (288 páginas) e O Mais Estranho dos Países (352 páginas), de Paulo Mendes Campos. Editora: Cia. Das Letras.