A Vida Amorosa dos
Artistas
Cinco casais, formados
por artistas consagrados e notórios em suas épocas, cujas relações abertas
desafiaram as convenções matrimoniais vigentes e revolucionaram as artes e
comportamento, são estudados em livro.
Por César Alves
Lou-Andreas Salomé, não dava muito crédito ao
talento de seu jovem amante e aspirante a poeta, quando – aos 36 anos, casada e
com o consentimento do marido – deu início ao caso com o ainda desconhecido e
muito mais jovem, Rainer Maria Rilke. Na época a bela, inteligente e
libertária Salomé já havia sido a terceira parte de uma tríade sexual e
amorosa, cujos outros dois amantes célebres eram o filósofo Friedrich Nietzsche
e Paul Reé e escandalizava a sociedade de sua época com seus escritos e idéias
de mulher a frente de seu tempo – rezam as más línguas que o filósofo do
martelo teria saído da relação aos pedaços, Salomé foi a Lilith que destroçou o
coração do “homem que matou Deus”.
Mais madura e com uma carreira e trajetória
definida, mesmo Salomé, talvez não pudesse imaginar que aquele relacionamento
iria ultrapassar o ardor da alcova, evoluindo para uma parceria amorosa e
criativa, num matrimônio que refletiria nas obras de ambos. Um casamento que
desafiaria as convenções. Artisticamente, íntimo e limitado a cumplicidade do
casal, e, do ponto de vista sexual, aberto a diversos parceiros, com o
conhecimento e consentimento de ambos.
Esta e outras histórias de cinco casais avant-la-lettré, todos formados por
artistas e intelectuais respeitados, cujos relacionamentos desafiaram as
convenções e puseram em dúvida a sacralidade do casamento, fazem parte do
fascinante e delicioso Amores Modernos,
livro de Daniel Bullen que acaba de chegar às livrarias brasileiras pela
editora Seoman.
A obra estuda as relações de Lou Salomé e
Rainer Rilke; Georgia O´Kieffe e Alfred Ztieglitz; Frida Khalo e Digo Rivera;
Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir e Henry Miller e Anais Nin, analisando o
reflexo que a maneira por eles escolhida para conduzir suas vidas, tanto
afetiva, quanto íntima, teve sobre suas obras e até que ponto tais artistas e
seus modos de vida estavam à frente de seu tempo e em sintonia com o
comportamento amoroso de casais contemporâneos – principalmente nos casos de
Sartre e Beauvoir e Henry Miller e Anais Nin, cujas relações foram inspiração para
muitos dos casais surgidos pós-Revolução Sexual e Contracultura.
O autor diz que o ponto de partida para seu
estudo tem origem na diversidade de acordos, cumplicidades, limites e formas
estabelecidas por casais contemporâneos para conduzir suas relações amorosas
que atualmente, mais do que nunca, se distancia do formato familiar tradicional
do matrimônio civil e religioso, sob as bênçãos dos pais de ambos os cônjuges
condenados a amarem-se até a morte, “na saúde e na doença; na alegria e na
tristeza”.
Bom, nos dias em que não é mais surpresa para
ninguém o declínio do casamento convencional, como instituição sagrada. O
próprio autor revela que o livro teve início mais por uma questão pessoal do
que por motivação acadêmica. Tentando entender seu próprio relacionamento, a
princípio, teria se voltado para a vida destes artistas mais por uma questão
pessoal do que acadêmica, confessa o autor. Foi quando percebeu que o material
biográfico oficial sobre tais nomes, no que se referia a seus relacionamentos,
perdia-se em clichês como o do infant
terrible mulherengo e a esposa que, incapaz de lidar com os relacionamentos
extraconjugais de seu homem, busca em outras aventuras uma compensação; ou a
mesma história do ponto de vista feminino, substituindo o infant terrible por uma femme
fatale, no caso. Quando muito, recorriam a justificativas como “eram artistas, cujos modos de vida
excêntricos eram reflexos de suas condições”.
O autor preferiu explorar o quanto a maneira
como tais casais levaram seus relacionamentos teve impacto na concepção da obra
de ambas as partes. Daí a escolha desses nomes; todos eles, casais em que ambos
eram artistas consagrados, mantiveram seus relacionamentos abertos e, embora
tenham convivido com as conseqüências e desentendimentos, comuns em qualquer
forma de relacionamentos – principalmente, quando abertos –, mantiveram-se
duradouros.
Apesar do título escolhido para a tradução
brasileira não dizer muita coisa – teria sido melhor traduzir literalmente o
título original, The Love Lives of The
Artists –, Amores Modernos, no
mínimo, contribui com as biografias pessoais e criativas de seus personagens,
através da perspectiva de seus relacionamentos.
Serviço:
Título: Amores
Modernos.
Autor: Daniel Bullen.
Editora: Seoman.
304 páginas.
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